top of page
Caio Machado

Som e fúria em "Assalto a 13ª DP"


Em uma madrugada de Los Angeles, uma gangue está prestes a agir. Na escuridão, não conseguimos ver direito como eles são, mas percebemos que estão armados. Então, a polícia anuncia sua chegada, sendo representada somente por braços, armas e névoa. A gangue tenta escapar e a polícia faz um massacre. Agora, vemos o rosto e corpo dos membros daquele grupo racialmente diverso, reduzidos a cadáveres ensanguentados jogados em um corredor estreito. Por meio da brutalidade de sua cena inicial, Assalto à 13ª DP deixa claro que conceitos como “civilização” e “barbárie” são muito frágeis, capazes de serem rompidos a qualquer momento, sem cerimônia. O longa do mestre John Carpenter possui uma premissa simples: um policial, uma secretária e um presidiário precisam sobreviver ao ataque de uma gangue durante a noite em uma delegacia desativada. Dentro dessa simplicidade, Carpenter elabora um cuidadoso jogo de contrastes, mostrando que a diferença entre a calmaria e o inferno depende apenas do ponto de vista.



Esse choque entre visões diferentes está presente em uma das primeiras cenas do policial Bishop (Austin Stoker), na qual ele sugere que a onda de violência pode estar sendo causada pelas “manchas solares” ou pela “pressão atmosférica”. Nessa fala, dita de forma casual e com uma pitada de boa fé, o protagonista se difere dos outros personagens como alguém que olha para o mundo com menos pessimismo, em contraste ao ambiente opressivo que o cerca.


Para mostrar quão sombria aquela região é, o filme adota o ponto de vista da gangue. Nenhum dos seus membros fala muito e nem precisam. O silêncio enquanto ajeitam as armas dentro do carro e buscam um alvo pelas ruas já é suficiente. A escolha de mostrar os potenciais alvos centralizados na mira da arma, enquanto os sintetizadores da trilha-sonora parecem se aproximar de uma presa, é perfeita para expor quão ordinária pode ser a violência. Quando a tensão finalmente dá uma trégua, na introdução dos personagens do pai e da filha, o horror que vem depois adquire um tom de deboche, aniquilando o resquício de pureza que se poderia encontrar ao longo do filme.



Utilizando majoritariamente planos americanos e planos médios, Carpenter aproveita para recriar Rio Bravo, de Howard Hawks, e atualizá-lo para um contexto urbano, subvertendo dinâmicas raciais da época ao desenvolver a bela relação de companheirismo entre Bishop, um homem negro, e Napoleon Wilson (Darwin Joston), um presidiário branco. Além da amizade, o filme também encontra espaço para o romance entre Leigh (Laurie Zimmer), a secretária, e Napoleon. As conversas dos dois, apesar de breves, são carregadas de um desejo que parece proibido, como uma flor tentando nascer no meio do concreto. É nas interações dos dois que a câmera se aproxima um pouco mais, destacando as expressões dos atores e fornecendo uma intimidade que parecia impossível naquele caos.



Assalto à 13ª DP é, essencialmente, um jogo de sobrevivência. Uma multidão sem rosto atira, janelas quebram, papéis voam. O ataque não parece vir de pessoas, mas de sombras que denunciam sua posição através do som das armas, dos passos, dos socos. Quando o som para, não é possível saber onde a morte está, como descobre a dupla de policiais desavisados perto do final do filme. Quando tudo está em silêncio, o ambiente urbano parece calmo, mas esconde uma brutalidade dilacerante se você decidir olhá-lo com mais atenção. No fim, sobrevive quem age em conjunto. Se for depender de noções como “lei” e “ordem”, pode ser que elas cheguem tarde demais.



Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page