Na penumbra do ringue, onde os contrastes entre o preto e branco se fundem em uma dança sombria, uma luz dura irradia do centro, enquanto as arquibancadas permanecem na escuridão — o espectador não consegue discernir nenhum rosto nas cadeiras desocupadas. De repente, outra cena se mescla ao retrato solitário: um homem, com os músculos tensos, grita diretamente para a câmera, como se estivesse golpeando um adversário invisível. O juiz tenta separá-los, mas ele continua a desferir golpes, mesmo que seu oponente permaneça oculto diante da visibilidade da câmera; é como se ele estivesse lutando contra nós, a câmera ou seu destino. O sino toca, a luta termina, mas o olhar do homem se perde no meio do vestiário. Dentro do ringue, ele foi imbatível, mas, fora dele, ele enfrenta mais uma derrota.
Este breve prólogo apresenta Fritz Von Erich, retratado por Holt McCallany, em seu último embate. No entanto, todos os elementos que compõem seu círculo familiar — filhos e esposa — são moldados à sua imagem. Assim, não apenas testemunhamos a decadência de um homem em crise, mas também a trajetória de alguém que escolheu moldar todos à sua própria semelhança.
Após a transição da paleta monocromática para cores vibrantes, a obra revela dois frames intrigantes: uma paisagem que evoca o nascer do sol, e o rosto de Kevin Von Erich (Zac Efron). Embora possam passar despercebidos para alguns, essas imagens estão intrinsecamente conectadas. Kevin, fisicamente semelhante a Fritz em seu auge, é, no entanto, moldado pelos sacrifícios impostos por seu pai. Ao longo do filme, enquanto o vemos lutando com sua identidade masculina e sua relação com seu corpo, talvez seu maior desejo seja simplesmente acordar numa manhã e contemplar o céu em seu esplendor matinal, o que só acontece após diversos sacrifícios.
A obra de Sean Durkin, diretor do longa-metragem, segue a trajetória biográfica dos personagens, mas se afasta dos métodos convencionais frequentemente empregados nesse tipo de narrativa. O realizador retrata figuras reais de forma pessoal, não caricata; porém, seu foco principal parece ser a exploração da masculinidade que permeia esses indivíduos. Os irmãos apresentam personalidades divergentes, mas, quando entram no ringue, transformam-se em personagens do mercado da luta. Embora Kevin possua qualidades notáveis para liderar o espetáculo, suas dificuldades de comunicação são evidentes, como demonstrado em sua incapacidade de se conectar com uma garota, após a luta. Sua vida foi dedicada a satisfazer as expectativas de seu pai e, como resultado, ele se encontra perdido, observando seus irmãos mais novos alcançarem um sucesso que ele próprio poderia ter conquistado.
Em certo período do filme, Kevin fala sobre uma maldição que rodeia sua família, o que transparece um típico clichê de acontecimento ou até mesmo de diálogo. Contudo, a cada conquista da família Von Erich de certos objetivos para alcançar um novo patamar no hall da fama, acontecia uma tragédia. Diferentemente de outros casos fílmicos, todas as ações que levam àquelas tragédias têm uma construção imagética sem o reconhecimento da câmera, então os atos dos irmãos contra seus próprios corpos só acontecem fora do quadro, deixando-nos imaginar seus últimos momentos de angústia. Em determinada cena, somos testemunhas de Kevin e Lance dialogando com o irmão sobre sua próxima viagem ao Japão, enquanto o vaso sanitário permanece manchado de sangue, evidência do vômito de Lance. Em vez de o protagonista intervir ou encaminhar seu irmão para cuidados médicos, eles simplesmente riem sobre a ideia de cancelar a viagem devido a uma possível doença, como se uma poça de sangue no banheiro não fosse motivo suficiente para tal decisão.
As tragédias continuam a assombrar a família, enquanto Kevin busca cuidar de seus irmãos de maneira discreta, evitando revelar que está os ajudando, pois, conforme sua criação, homens fortes não precisam de ajuda. Quando Kerry, o segundo irmão mais velho, enfrenta pensamentos suicidas após um acidente de carro que o deixa incapaz de continuar lutando, ele faz uma ligação para Kevin em busca de apoio e para compartilhar seus sentimentos. Essa breve conversa representa o ápice da intimidade que Kevin compartilhou com seus irmãos ao longo de suas vidas. Devido à distância geográfica, Kevin então liga para seu pai, pedindo que cuide de Kerry, mas seu pai simplesmente ignora o pedido, rotulando a informação como frescura. Ao amanhecer, o rosto de Kerry é encontrado escondido atrás do tronco de uma árvore, e nós, espectadores, enxergamos a angústia de Kevin ao testemunhar mais uma tragédia familiar, a perda de seu último irmão. A partir dessa cena é criada outra belíssima: de maneira fantasiosa, Kerry sai do seu corpo e vai em direção à paisagem do entardecer. Com seu corpo em perfeitas condições, ele encontra seus outros irmãos naquela espécie de paraíso, e o que fazem é compartilhar um abraço, sem muitos diálogos.
Distante de qualquer paraíso cinematográfico, Kevin encara a figura que moldou sua vida desde tenra idade: seu pai. O confronto não se desenrola com socos ou truques típicos da luta livre, mas sim mediante uma torrente de sentimentos e gritos que ecoam, culminando na declaração de que seu pai é o responsável por todos aqueles corpos sem vida. Na cena derradeira, Kevin contempla o amanhecer, enquanto seus filhos brincam ao redor do jardim. Após não derramar uma única lágrima ao longo da narrativa, mesmo sendo um conteúdo intrinsecamente dramático, Kevin finalmente cede à emoção, chorando diante de seus filhos. Num momento de vulnerabilidade, ele questiona retoricamente: "Homens não podem chorar, né?" Talvez, se as lágrimas fossem mais aceitas, sua família não precisaria sacrificar tanto em busca de um cinturão.
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